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CELAC-Declaração de Buenos Aires: Omissões notórias em relação aos Povos Indígenas

02 fevereiro, 2023 | Ricardo Changala

Os Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) aprovaram a Declaração de Buenos Aires em 24 de janeiro de 2023.

Em seus 111 numerais, recolhe-se uma ampla variedade de temas de grande relevância para os povos e governos da região, reunindo um espírito renovado da CELAC tanto pela mudança de orientação de vários dos países membros como, principalmente, pela reincorporação do Brasil à sua operação.

Em seu númeral 4, a Declaração afirma o compromisso da CELAC “…avançar com determinação no processo de integração, promovendo a unidade e a diversidade política, econômica, social e cultural de nossos povos”.

No entanto, este reconhecimento da diversidade cultural dos povos da região não encontra correlato adequado no conjunto de parágrafos da Declaração.Claro que nenhum documento desse tipo consegue abranger todas as questões regionais, mas em relação aos Povos Indígenas chama a atenção a ausência de aspectos essenciais.

É difícil explicar que, em uma região com cerca de 826 Povos Indígenas que representam em média cerca de 10% da população total, mas que em alguns países supera em muito esse percentual (casos de Bolívia EP, Guatemala ou México), não há nenhuma seção específica sobre eles, sobre seus direitos e sua relevância como sujeitos sociais e políticos.

Além disso, lembremos que, em julho passado, os países latino-americanos que compõem a CELAC aprovaram uma primeira avaliação do Plano de Ação Ibero-Americano para a implementação dos direitos dos Povos Indígenas (2018-2028), assumindo uma série de compromissos para promover o tema, sem que o ponto sequer seja mencionado nesta Declaração.

Por outro lado, se houver uma seção específica sobre a população afrodescendente (número 62), na qual é ratificado o compromisso de promover, respeitar, garantir e proteger os direitos dos afrodescendentes, bem como os processos de erradicação de todas as formas de discriminação discriminação racial, xenofobia e formas correlatas de intolerância, em busca de sociedades com maiores níveis de equidade e justiça racial.

A Declaração incorpora a seção intitulada “Línguas Indígenas”, algo que por si só deveria ser destacado positivamente, embora insuficiente. São três numerais pelos quais se destaca o lançamento da Década Internacional das Línguas Indígenas (2022-2032), sauda-se a criação do Instituto Ibero-Americano de Línguas Indígenas, convidando os Estados da América Latina e Caribe fazer parte de sua criação e fortalecimento e, finalmente, são reconhecidos acordos anteriores sobre o direito de revitalizar línguas e tradições orais e filosóficas, seus sistemas de escrita e sua literatura, reconhecendo a importância de estabelecer alianças para coordenar ações conjuntas nesse sentido .

É difícil entender o motivo, tanto nesta seção sobre as línguas indígenas quanto em outros numerais da Declaração, bem como aqueles que se referem, por exemplo, ao cuidado da Mãe Terra (30) ou à importância dos camelídeos ( 9) , ou a proteção da água e dos recursos hídricos (36), omite-se o sujeito político chave para a consecução desses objetivos: os Povos Indígenas. A leitura literal desta Declaração parece promover a revitalização das línguas, o cuidado da Mãe Terra e outros objetivos, sem um papel essencial, dirigente e essencial dos Povos Indígenas que nunca são mencionados.

O mesmo ocorre quando a Declaração convoca ao diálogo social sobre diversos aspectos, como inovação e tecnologia, ignorando os Povos Indígenas e seus saberes ancestrais, como se não fizessem parte da ampla bagagem cultural da humanidade.

Em um contexto regional em que as demandas, propostas e realidades dos Povos Indígenas estão cada vez mais presentes na legislação e nos debates nacionais, quando governos recém-instalados como o do Brasil têm realizado mudanças significativas rumo ao reconhecimento dos Povos Indígenas. desenvolvimento, esta Declaração parece estar muito aquém da realidade concreta sobre a qual pretende incidir.

O texto integral da Declaração está disponível no seguinte link https://www.lacommunis.org/wp-content/uploads/2023/01/CELAC-DECLARACION-DE-BUENOS-ARES-Version-Final.pdf