Um novo 8 de março mostra que, em um momento de grandes mobilizações, demandas e propostas de mulheres em todo o planeta, mudanças profundas e sustentáveis ainda não foram alcançadas.
Se a situação geral das mulheres no mundo apresenta múltiplas limitações para o acesso igualitário aos direitos humanos fundamentais, para as mulheres indígenas a distância entre direitos e realidade é ainda maior.
Enfrentam diversas formas de violação dos direitos humanos individuais e coletivos, não apenas civis, políticos e socioeconômicos, mas também outras formas de violência, como as derivadas de práticas tradicionais, violência sexual, tráfico, violência doméstica e assassinatos por motivos de gênero. Como afirmou a Relatora Especial, “para proteger os direitos das mulheres indígenas, é necessária uma mudança de paradigma e a formulação de um enfoque multidimensional”[1].
Recentemente, a Organização Internacional do Trabalho publicou um breve, mas contundente material, no qual, a partir da aplicação de um novo indicador sobre a disparidade laboral, afirma que, em geral, as estimativas apontam para sérias dificuldades enfrentadas pelas mulheres quando se trata de encontrar trabalho, especialmente em países menos desenvolvidos[2].
Refira-se que, em 2022, a exclusão global de emprego situou-se em cerca de 473 milhões de pessoas, o que equivale a uma taxa de exclusão laboral de 12,3 por cento, que representa a parte dos que gostariam de trabalhar que se encontram sem emprego.
Para as mulheres, as exclusões trabalhistas são muito maiores no chamado “mundo em desenvolvimento” (onde vive a maioria dos Povos Indígenas), atingindo 24,9 e 17,4 por cento nos grupos de renda baixa e média baixa, respectivamente. Para comparação, as taxas correspondentes para homens são 16,6 e 11,0 por cento, significativamente mais baixas do que as taxas para mulheres.
A situação também é preocupante em termos de renda.
Em 2019, para cada dólar que os homens ganham em renda, as mulheres ganharam apenas 51 centavos. Em países de renda baixa e média-baixa, a disparidade de gênero nos rendimentos do trabalho é consideravelmente pior, com as mulheres ganhando 33 centavos e 29 centavos de dólar, respectivamente. Em contraste, em países de renda alta e média-alta, a renda relativa do trabalho das mulheres chega a 58 e 56 centavos, respectivamente, para cada dólar ganho pelos homens.
A desigualdade de gênero é uma realidade global. Por exemplo, na Alemanha, em fevereiro de 2023, o Tribunal Federal do Trabalho proferiu uma decisão sobre discriminação salarial entre uma trabalhadora e seu colega de trabalho, considerando que a diferença de tratamento por parte da empresa não poderia ser justificada invocando o fato de que o salário a base mais alta do colega homem não se deveu ao gênero, mas ao fato de terem negociado um salário maior[3].
Mas, como mostra o estudo da OIT, as diferenças são muito mais profundas, não apenas em alguns países, mas em relação a certos grupos, como os povos indígenas e as mulheres entre eles. Sem modificações estruturais nas relações de gênero, não haverá mudanças profundas e sustentáveis para a realização de todos os direitos humanos para todas as pessoas.
É isso que leva a antropóloga Rita Segato a afirmar que “nenhuma revolução até hoje chegou ao seu destino porque lhe falta um azulejo que deveria estar abaixo, que fundamenta o seu projeto e que é o patriarcado”[4].
[1] ONU, Relatório da Relatora Especial sobre os direitos dos povos indígenas, A/HRC/30/41, 6 de agosto de 2015.
[2] OIT, Spotlight on Work Statistics n°12, New data shine light on gender gaps in the labor market, March, 2023, https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/—dgreports/—stat/documents/publication/wcms_870519.pdf
[3] A sentença pode ser conferida em: https://www.bundesarbeitsgericht.de/sitzungsergebnis/8-azr-450-21/
[4] Palestra proferida no Encontro Internacional Feminista 2023, dia 05 de março de 2023 na cidade de Madri, Espanha.