Por Víctor Báez Mosqueira
No último domingo, 22 de junho, o jornal La Tribuna, hoje em formato digital, trouxe na manchete a seguinte notícia: “Analista propõe o modelo chileno para reformar as pensões”. Mais abaixo, informava que “o analista internacional César Addario Soljancic, assessor do presidente Bukele, propõe para o Paraguai um sistema de pensões baseado na capitalização individual, como alternativa ao modelo atual do IPS”. Mais um que propõe a privatização da gestão dos fundos de aposentadoria.
Situações como essa já havíamos antecipado há dois anos, quando afirmávamos que a Lei de criação da Superintendência de Aposentadorias e Pensões, no Paraguai, não tinha como objetivo principal o controle e a garantia dos fundos de aposentadoria, mas sim a verdadeira intenção de abrir as portas para que bancos e financeiras gerissem os fundos desse setor da seguridade social conforme sua vontade e conveniência. Aí não houve nem haverá ponto sem nó.
Naquela época, descrevemos amplamente o que é o modelo chileno de capitalização individual, imposto durante a ditadura de Pinochet a toda a população do país andino, com exceção dos militares e carabineiros. Demos exemplos concretos das consequências nocivas para os rendimentos dos chilenos e chilenas aposentados. Agora que o senhor Addario Soljancic é assessor do presidente Bukele, de El Salvador, queremos trazer alguns dados sobre as aposentadorias e pensões desse país centro-americano, que adotou o “modelo chileno” no ano de 1999. Após 26 anos de sua implementação, pode ser avaliado sem medo de equívocos.
Como início do debate, propomos apresentar informações que são de conhecimento público no país de Nayib Bukele e, por ora, vamos nos limitar a transcrever o que dizem, com a intenção de aprofundar o tema conforme surgirem contra-argumentos.
- A publicação virtual salvadorenha (TSCAHORA.com), de 7 de fevereiro de 2025, traz um artigo escrito por Carmen Rodríguez, intitulado: “Governo salvadorenho tomou emprestado US$ 2 bilhões de dólares dos fundos de pensões”. Continua dizendo que “A Mesa de Trabalho por uma Aposentadoria Digna indica que o Executivo utilizou pelo menos 80% dos fundos arrecadados pelas administradoras de pensões”. Há um vídeo com entrevista a Patricio Pineda, dirigente dessa entidade, confirmando essa informação. Embora o governo negue, há sérias dúvidas sobre a sustentabilidade do sistema.
- Um estudo realizado pela Fundação Friedrich Ebert, datado de outubro de 2023, intitulado “O sistema de pensões em El Salvador”, diz em sua introdução que “o usufruto de uma pensão por velhice é um direito ao qual pouquíssimas pessoas têm acesso em El Salvador”. Nos antecedentes, afirma que “em 2022 apenas 20 de cada 100 homens com 60 anos ou mais receberam algum tipo de aposentadoria, enquanto esse número cai para 11 de cada 100 mulheres com 55 anos ou mais”. Embora membros do governo paraguaio se recusem a abordar as questões de gênero, os dados demonstram que o sistema privado de aposentadorias perpetua a desigualdade entre homens e mulheres até os anos da velhice. Podemos aprofundar muito mais esse tema, mas hoje nos limitamos a apresentar os dados iniciais, caso insistam em vender a versão salvadorenha do sistema chileno de pensões.
Em outras palavras, uma das tabelas estatísticas publicadas pelo estudo citado afirma que “em 2022, 80% dos homens em idade de aposentadoria não contavam com nenhum benefício, enquanto aproximadamente 89% das mulheres nessa faixa etária estavam na mesma situação”. Isso significa que apenas 2 homens e 1 mulher em cada 10 homens e 10 mulheres recebem aposentadoria.
Por fim, uma publicação da Mesa de Trabalho por uma Aposentadoria Digna, datada de março de 2025, em San Salvador, capital de El Salvador, afirma em suas conclusões que se “deve discutir, consultar e propor, a partir da cidadania, uma nova Reforma Integral de Pensões que beneficie o trabalhador e não apenas os cofres do Estado ou de empresas privadas” (sic), evidenciando a decepção e o desencanto da população trabalhadora salvadorenha, tanto do setor formal quanto informal da economia.
Faltaria acrescentar, nas próximas análises, algumas semelhanças entre a realidade salvadorenha e a paraguaia. Sempre dizemos que o Paraguai é um país da América Central situado no Cone Sul. Por exemplo, El Salvador possui um setor informal que chega a 55%, segundo a FES, enquanto no Paraguai essa cifra varia entre 65% e 70%. Isso demonstra que a “receita salvadorenha” não aliviará os males paraguaios.
A conclusão inevitável é que o sistema de aposentadorias privadas, seja chileno, salvadorenho ou de outra nacionalidade, cria negócios altamente lucrativos para o setor financeiro (para o qual o senhor Addario Soljancic parece trabalhar) e para os governos que preferem usar esses fundos para financiar seus próprios gastos, em vez de cobrar impostos de quem deve pagá-los. Mas, de nenhuma maneira, beneficia as grandes maiorias que vivem do suor do próprio rosto e desejam garantir o direito a uma velhice digna.
Assunção, 30 de junho de 2025